O fenômeno Woke e a reação global: do ativismo à política de cancelamento e à ascensão da direita – por Osvaldo González Iglesias

Por Osvaldo González Iglesias 

Na última década, o termo “acordei” deixou de ser um apelo à sensibilização para os problemas sociais e passou a ser um conceito altamente polarizador que tem gerado intensos debates nas esferas política e cultural. À medida que a “política de cancelamento” se espalhou em alguns países, também provocou uma forte reação que alimentou a ascensão de partidos de direita em várias partes do mundo. Este artigo explora o significado original do movimento wake, a sua implementação nas políticas públicas e culturais e como a reação contra ele redefiniu o mapa político global.

A Origem do Movimento Woke

O termo “acordei” surgiu na comunidade afro-americana nos Estados Unidos como um apelo para “acordar” para as injustiças raciais e sociais. Seu uso inicial esteve ligado ao movimento pelos direitos civis e, posteriormente, ao ativismo contra a violência policial. No entanto, com a ascensão dos meios de comunicação social e a crescente influência dos movimentos progressistas, o termo expandiu-se para abranger um espectro mais amplo de causas, como o feminismo, a diversidade de género, a equidade económica e a justiça climática.

O movimento wake consolidou-se como uma posição que buscava evidenciar e combater estruturas de opressão na sociedade. No entanto, a sua rápida expansão e a radicalização de alguns dos seus expoentes geraram tensões com setores que viam estas ideias como uma ameaça às liberdades individuais e à cultura tradicional.

O fenômeno “woke” refere-se a uma consciência social e política sobre questões de injustiça, desigualdade e discriminação, especialmente no que diz respeito a raça, gênero, orientação sexual e outras formas de opressão. A palavra “woke” vem do inglês e originalmente significava “acordado” ou “desperto”. Nos Estados Unidos, o termo começou a ser usado nas décadas de 1960 e 1970 dentro do movimento negro, em um contexto de conscientização sobre os direitos civis e as lutas contra o racismo.

Com o tempo, o conceito se expandiu para abranger uma postura de vigilância e defesa de direitos humanos e sociais mais amplos, como justiça de gênero, direitos LGBTQ+, e ambientalismo, entre outros. Ser “woke” é, portanto, estar atento e engajado com as questões sociais, buscando ativamente reconhecer e corrigir desigualdades e opressões.

No entanto, nos últimos anos, o termo passou a ser utilizado de forma mais crítica e pejorativa, especialmente por aqueles que o associam a uma forma excessiva ou exagerada de politicamente correto, onde os indivíduos ou instituições seriam acusados de serem “woke” por se concentrar demais em evitar ofensas e promover uma agenda social específica. Nesse contexto, algumas pessoas consideram o fenômeno “woke” como algo que pode levar a um excesso de moralismo ou censura.
Em resumo, o fenômeno “woke” pode ser visto de maneira positiva, como uma postura de defesa de direitos e justiça social, ou de forma crítica, como uma tentativa de controle de discurso e comportamento.

A Política de Cancelamento e sua Implementação

A “política de cancelamento” refere-se à prática de marginalizar, censurar ou boicotar pessoas ou instituições que expressem opiniões consideradas ofensivas ou contrárias aos princípios acordados. Embora inicialmente tenha sido aplicado a figuras com histórico de racismo, sexismo ou discriminação, com o tempo seu alcance se expandiu, afetando acadêmicos, escritores, artistas e até políticos que questionavam certos dogmas progressistas.

Em países como os Estados Unidos, o Reino Unido e o Canadá, a cultura do cancelamento tornou-se institucionalizada nas universidades, nos meios de comunicação social e no mundo empresarial. As empresas despediram funcionários por postagens antigas nas redes sociais, os professores foram punidos por debater temas delicados e as figuras públicas viram as suas reputações destruídas por simples divergências ideológicas. Além disso, as plataformas digitais tornaram-se um campo de batalha onde os linchamentos virtuais e as “campanhas de cancelamento” deixaram pouco espaço para debate.

O efeito bumerangue: a reação contra o Wokeismo

Longe de se consolidar como consenso social, a política de cancelamento gerou forte resistência que se traduziu na ascensão de partidos de direita e movimentos conservadores em todo o mundo. Nos Estados Unidos, o ex-presidente Donald Trump fez da luta contra a “cultura acordada” um pilar do seu discurso político, o que lhe permitiu conectar-se com setores que se sentiam atacados pelas novas normas culturais. Na Europa, figuras como Giorgia Meloni em Itália e Marine Le Pen em França capitalizaram o descontentamento com o que chamam de “imposições ideológicas da esquerda progressista”.

Em países como o Brasil e a Argentina, a reação contra o progressismo alimentou a ascensão de líderes que denunciam a “ditadura do politicamente correcto” e defendem os valores tradicionais. Javier Milei, por exemplo, construiu grande parte do seu discurso contra o “marxismo cultural” e a “ideologização” da educação e das políticas públicas.

A resistência ao movimento acordado também se refletiu em mudanças legislativas. Nos Estados Unidos, vários estados governados pelos republicanos aprovaram leis que restringem o ensino de teorias racialistas nas escolas e protegem a “liberdade de expressão” nas universidades. No Reino Unido, o governo de Rishi Sunak criticou abertamente as políticas de inclusão radical e promoveu uma agenda centrada na “liberdade de pensamento”.

Um fenômeno em retirada?

À medida que as críticas ao movimento Wake se multiplicam, alguns setores progressistas começaram a repensar as suas estratégias. Até figuras icónicas da esquerda alertaram para os excessos da cultura do cancelamento, argumentando que esta poderia minar a diversidade de pensamento e fortalecer os seus oponentes.

O debate em torno do wakeismo e do cancelamento está longe de ser resolvido. Enquanto alguns vêem isso como uma correção necessária às injustiças históricas, outros percebem-no como uma ameaça à liberdade individual. O que é inegável é que o seu impacto foi profundo, moldando uma nova dinâmica política global onde a reacção contra ele alimentou a ascensão da direita em numerosos países.

A questão que permanece é se o movimento acordado continuará a ser uma força dominante ou se a sua reação política marcará o seu declínio definitivo.

Radiografiara de una sociedad deprimida. (Como no agradecerle eternamente a Messi) - Debate y Convergencia

OSVALDO GONZÁLEZ IGLESIAS – Escritor e Dramaturgo. Director do jornal eletrônico Debate y Convergencia, correspondente do jornal Tribuna da Imprensa Livre na Argentina.

Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com


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